sábado, maio 30, 2009

É exercitando que se aprende!




Traduzi, em 2008, dois livros para a editora LP&M.
Ambos eram de auto-ajuda, mas nem por isso menos interessantes. Aprendi muito sobre a prática da tradução nesses trabalhos e percebi que tão difícil quanto verter de um idioma a outro, é escrever bem na nossa própria língua. Fico sempre muito decepcionada quando deixo passar batido algum erro! É impressionante como sempre algo escapa. Por esse motivo, tenho sempre na minha mesa gramáticas, dicionários de regência verbal e nominal e de sinônimos.
E, para melhorar ainda mais meu velho português, estou fazendo um curso de extensão de Revisão de Textos. Essa experiência está sendo fundamental para aprimorar meu estilo de escrita e para aguçar a percepção sobre os meus vacilos na hora de escrever.

Quem quiser saber mais sobre os livros dos quais falei é só clicar nos seguintes links:
Os homens (às vezes, infelizmente) sempre voltam
e
Amar ou depender?

Tradutor: um mediador de perdas?



Na foto, o filósofo Paul Ricoeur

Resenha de Sobre la traducción, de Paul Ricoeur. Tradução e prólogo de Patricia Wilson. Buenos Aires: Paidós, 2005, 75 pp.

O livro, editado em Buenos Aires, é uma tradução para o espanhol do original francês lançado em 2004 pela Bayard. Reúne três conferências do filósofo hermenêutico Paul Ricoeur. Os textos têm em comum a constante menção do autor aos trabalhos do teórico e tradutor francês Antoine Berman, principalmente porque a tradução como relação com o estrangeiro é um dos fios condutores da obra.
O primeiro texto, “Desafío y felicidad de la traducción”, é um discurso pronunciado no Instituto Histórico Alemão em 1997. Nele, Ricoeur parte do título do ensaio A prova do estrangeiro, de Berman, mais precisamente do fato de a tradução ser uma épreuve, termo que em francês tem o sentido de “pena experimentada” e de “prova”. Para Ricoeur, a tradução traz consigo uma certa aceitação de perda. E a tarefa do tradutor é estar nessa incômoda situação de mediador, que o coloca à prova. Por causa dessa “perda”, o trabalho da tradução, segundo ele, assemelha-se ao “trabalho do luto”, e ao “trabalho de recordar” (no sentido usado por Freud em seus ensaios psicanalíticos), e também ao “trabalho de parto”.
A tradução, por um lado, atenta contra a sacralização da chamada língua materna, e há um movimento de rechaço à experiência do estrangeiro por parte da língua de chegada. Entre o estrangeiro (representado pela obra, o autor e sua linguagem) e o leitor, interpõem-se o tradutor. Segundo Ricoeur, o rechaço da mediação com o estrangeiro e a pretensão de auto-suficiência nutriu numerosos etnocentrismos lingüísticos e pretensões de hegemonia cultural. Isso ocorreu com o latim, da Antigüidade tardia até o fim da Idade Média, com os franceses na época clássica, e com os anglo-americanos hoje em dia.
Resistência, conceito que Ricoeur toma emprestado da psicanálise, é o que o trabalho de tradução e o tradutor econtrariam em vários níveis. Por isso, para alcançar a “felicidade da tradução” seria necessário abdicar ao ideal de tradução perfeita. Ele conclui a conferência afirmando que essa felicidade deve estar na “hospitalidade lingüística”, na qual “o prazer de habitar a língua do outro é compensado pelo prazer de receber na própria casa a palavra do estrangeiro”. Há, aí, outra vez uma menção a uma obra de Berman, cujo título é La traduction et la lettre ou l´auberge du lointain [A tradução e a letra ou o albergue do distante] (veja resenha desse livro aqui no blog).
O excerto seguinte, “El paradigma de la traducción”, é uma aula inaugural proferida em Paris em 1998, e o terceiro texto, intitulado “Un “pasaje”: traducir lo intraducible”, é inédito. Neles, Ricoeur trata em última instância da questão da possibilidade e da impossibilidade da tradução. Defende que há duas vias de acesso ao problema colocado pelo ato de traduzir: tomar o termo “tradução” em seu sentido estrito de transferência de uma mensagem verbal de uma língua a outra, ou tomá-lo em sentido amplo, como sinônimo de interpretação de todo conjunto significante dentro da mesma comunidade lingüística. O primeiro enfoque foi o escolhido por Berman; o segundo, por George Steiner em After Babel.
Ele aborda o debate sobre a diversidade das línguas, as diferenças e as semelhanças possíveis entre as mesmas, e a utopia da língua perfeita. Primeiro, diz ele, há a questão da diferença entre as línguas, em seus aspectos lexicais, fonéticos, sintáticos, etc. Além disso, as línguas são diferentes não apenas pelo fato de recortarem diferentemente o real, mas também na maneira de recompô-lo no discurso. As orações são pequenos discursos tirados de discursos maiores que são os textos. Esses, por sua vez, fazem parte de conjuntos culturais que expressam visões de mundo diferentes; e por aí vão se tornando cada vez mais complexas as relações.

*** Esta resenha foi originalmente publicada nos Cadernos de Tradução (UFSC). Para citá-la, acesse o original clicando AQUI.