segunda-feira, junho 01, 2009

Leitura para "desbloquear"



Estou lendo dois livros sobre a escrita literária. O primeiro deles, eu já havia lido há tempos, só que em inglês. Trata-se de Escrevendo com a alma, de Natalie Goldberg. Conheci o original por intermédio da minha amiga Ana Menezes, que o trouxe de Nova York.
O título em inglês é Writing down the bones... Pareceu-me que o título perdeu bastante a força ao ser traduzido como Escrevendo com a alma. Escrevendo com as vísceras, ou algo assim, seria mais fiel ao espírito do trabalho, até porque a autora propõe que a escrita seja encarada como algo "físico", não somente espiritual. Ela afirma:
"O que as pessoas não percebem é que escrever é um ato físico. Não envolve apenas o pensamento. Trabalha a visão, olfato, paladar, sensações - tudo o que está vivo e ativo". Ela propõe, como método, manter as mãos em movimento, escrevendo até que se perca o controle.
Outro argumento de Natalie é que a escrita requer muito exercício; por isso, compara o ato de escrever com o de correr: "quanto mais treinamos, melhor nosso desempenho", diz . Retomando: já havia lido o livro, mas aí achei a tradução para o português, feita por Camila Lopes Campolino, em 2008, para a Martins Fontes, e resolvi reler por considerar que esse livro é muito bom no quesito "desbloquear o escritor que existe em você".
Gosto especialmente desta idéia do guru budista de Natalie, um tal Katagiri Roshi:

"A capacidade é como um manancial sob a superfície do solo".

Ou seja, é preciso prática e esforço para ter acesso a esse "rio subterrâneo" por onde fluem nossas experiências e emoções.

No capítulo intitulado "Compostagem", Natalie diz:

"A consciência leva um certo tempo para filtrar as experiências. (...) Imagine que o corpo é um depósito de lixo: acumulamos experiência e, a partir da decomposição das cascas de ovo, folhas de espinafre, pó de café e sobras de carne, descartados pela mente, surgem nitrogênio, calor e adubo. É desse solo fértil que brotam nossos poemas e histórias. (...) Mas isso leva tempo."

É a aceitação de que escrever sobre coisas significativas requer tempo e um longo mergulho do escritor em sua subjetividade. Digerir as experiências, ruminar, como dizia Nietzsche...

O outro livro que está na minha cabeceira é Para ler como um escritor, de Francine Prose (Zahar,2008, tradução de Maria Luiza Borges). Com um sobrenome desses (Prosa!), pode-se dizer que ela é uma predestinada. :) Mas vou faler sobre ele em outro post, quando eu avançar um pouco mais na leitura.